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- 2º Grau
Publicado por Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul
Detalhes da Jurisprudência
Processo
Órgão Julgador
Sétima Câmara Cível
Publicação
05/12/2016
Julgamento
30 de Novembro de 2016
Relator
Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves
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Inteiro Teor
SFVC
Nº 70071573950 (Nº CNJ: 0367589-67.2016.8.21.7000)
2016/Cível
REVISÃO DE ALIMENTOS. ALTERAÇÃO DA BASE DE INCIDÊNCIA. CABIMENTO. REDEFINIÇÃO DO QUANTUM. 1. A ação de revisão de alimentos tem por pressuposto a alteração do binômio possibilidade-necessidade e visa a redefinição do valor do encargo alimentar, que se subordina à cláusula rebus sic stantibus, como se vê do art. 1.699 do Código Civil. 2. Justifica-se a revisão do encargo alimentar quando há prova segura da efetiva modificação da situação financeira do alimentante, já que não possui mais os ganhos fixos que tinha como militar, e está auferindo renda como motorista autônomo. 3. A pensão alimentícia deve ser suficiente para atender as necessidades da alimentada, mas dentro das possibilidades do alimentante. 4. Como o alimentante não tem ganhos fixos, é cabível a redefinição do encargo alimentar para incidir em percentual do salário mínimo. Recurso provido.
Apelação Cível
Sétima Câmara Cível
Nº 70071573950
(Nº CNJ: 0367589-67.2016.8.21.7000)
Comarca de Bento Gonçalves
M.M.S. R.P.S.M.F.P.M.
.
APELANTE
L.S.S.
..
APELADO
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, dar provimento ao recurso.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), as eminentes Senhoras Des.ª Liselena Schifino Robles Ribeiro e Des.ª Sandra Brisolara Medeiros.
Porto Alegre, 30 de novembro de 2016.
DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES,
Relator.
RELATÓRIO
Des. Sérgio Fernando De Vasconcellos Chaves (RELATOR)
Trata-se da irresignação de MANUELA M. S., menor representada por sua genitora FRANCIELE P. M., com a r. sentença que julgou improcedente a ação de revisão de alimentos que move contra LUCAS S. S.
Sustenta a alimentada que o valor fixado não é mais suficiente, pois o alimentante, na época do acordo, era militar e os alimentos eram descontados diretamente da folha de pagamento. Afirma que, por estar exercendo atividade laboral como motorista autônomo, o alimentante faz pagamentos em valor inferior. Diz que, como bem ponderou o Ministério Público, o valor de 30% do salário mínimo é o mínimo aceitável, pois a falta de emprego formal não justifica a redução do valor fixado, devendo ser alterada a base de incidência dos alimentos. Pretende seja reformada a sentença. Pede o provimento do recurso.
Intimado o recorrido ofereceu contrarrazões pugnando pelo desprovimento do recurso.
Com vista dos autos, a douta Procuradoria de Justiça lançou parecer opinando pelo conhecimento e provimento do recurso.
É o relatório.
VOTOS
Des. Sérgio Fernando De Vasconcellos Chaves (RELATOR)
Estou acolhendo o pleito recursal.
Com efeito, é preciso gizar, inicialmente, que, para o acolhimento do pedido de alteração do encargo alimentar, é imprescindível que se verifique a efetiva modificação do binômio possibilidade-necessidade, que constitui em si uma relação de proporcionalidade.
Assim, para revisar o valor da verba alimentar é preciso que tenha havido ou a modificação nas necessidades de quem recebe os alimentos ou nas possibilidades de quem está obrigado a prestá-los.
Em outras palavras, para o cabimento do pleito revisional é preciso que a verba alimentar tenha ficado inadequada ao binômio legal, em razão de fato novo superveniente à fixação dos alimentos, pois a obrigação alimentar vincula-se à cláusula rebus sic stantibus, inserida no art. 1.699 do Código Civil.
No caso em exame, é incontroverso que o alimentante deixou de ter vínculo empregatício, passando a exercer atividade laboral sem vínculo formal de emprego. Ou seja, ele era militar e passou a trabalhar como motorista autônomo, fato este que justifica a redefinição da obrigação alimentar.
Lembro que, mesmo que não tenha havido alteração substancial nos ganhos do alimentante, a sua remuneração sofreu alteração e não pode mais servir como referência para a atualização da verba alimentar. Ou seja, é preciso modificar o critério de reajuste e a forma mais adequada é a redefinição da base de incidência dos alimentos, que deve ter como referencial agora o valor do salário mínimo.
Como não ficou comprovado, no curso do processo, que o genitor, esteja auferindo ganhos superiores ao que tinha anteriormente, mas sim que ele não possui mais vínculo empregatício, entendo cabível a fixação da verba alimentar em 30% do salário mínimo, como pretende a recorrente, mostrando-se necessária esta alteração para que seja observado o binômio necessidade-possibilidade.
Friso que estou fixando o encargo alimentar no valor de 30% do salário mínimo, pois o alimentante possui outros dois filhos menores, (fls. 40/41) para os quais está obrigado a prestar o sustento, devendo ser observado tantos seus ganhos, como também seus encargos de família.
Finalmente, estou acolhendo, também, o parecer de lavra da ilustre Procuradora de Justiça Denise Maria Duro Reis, que peço vênia para transcrever, in verbis:
Inicialmente, esclarece-se que a apelante busca a reforma da decisão proferida nos autos da ação revisional de alimentos, que manteve a obrigação alimentar em favor de Manuela, menor representada por sua genitora, no patamar de 25% dos rendimentos líquidos do genitor, por entender o magistrado a quo que não restou demonstrada modificação benéfica das condições financeiras do alimentante.
Argumenta, em síntese, que os alimentos foram originalmente estabelecidos quando o alimentante era militar, sendo o valor da pensão à época correspondente a R$ 600,00. Sustenta que houve alteração de sua condição, tendo em vista que o ora apelado passou a trabalhar como motorista de táxi autônomo, sem renda fixa. Aduz a apelante que nesse novo cenário, sem renda fixa, passou a perceber pensão alimentícia em valor ínfimo. Por isso, requer a reforma da decisão, a fim de que os alimentos sejam estabelecidos em 30% do salário mínimo.
Adianta-se que é caso de provimento do recurso.
Com efeito, salienta-se que a decisão que decide sobre a pensão alimentícia não faz coisa julgada material, mas apenas formal, podendo ser alterada, consoante dispõe o artigo 505, inciso I, do Código de Processo Civil. Nesse sentido, quando houver modificação superveniente das circunstâncias relativas às necessidades do alimentado e aos recursos do alimentante, é facultado ao interessado solicitar a revisão da pensão alimentícia, ou mesmo a sua exoneração, em observância à natureza rebus sic stantibus de toda convenção ou decisão referente a alimentos.
Desse modo, tem-se que para o redimensionamento do encargo alimentar é imprescindível prova robusta acerca da alteração das possibilidades do alimentante ou da necessidade do alimentando.
A propósito, esta Colenda Câmara Cível:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE ALIMENTOS. FILHO MENOR. REDUÇÃO DO ENCARGO. DEMONSTRAÇÃO DEALTERAÇÃO NO BINÔMIO POSSIBILIDADE/NECESSIDADE. A ação de revisão de alimentos, conforme o disposto no art. 1.699 do CC, tem por pressuposto o exame da alteração do binômio possibilidade/necessidade, e visa à redefinição do valor do encargo alimentar. Não demonstrada, no caso, alteração na situação financeira do alimentante, descabe a redução dos alimentos. RECURSO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70069726636, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Liselena Schifino Robles Ribeiro, Julgado em 29/06/2016) (grifou-se).
In casu, verifica-se que foram acordados alimentos em favor de Manuela, no ano de 2011, nos autos do processo tombado sob o nº 030/1.11.0006245-0, no patamar equivalente a 25% dos rendimentos líquidos do alimentante (fl. 13).
Pois bem.
A alimentanda conta, atualmente, com 05 anos de idade (fl. 09). Portanto, sinala-se que a necessidade de alimentos é presumida de forma absoluta e independe de prova no caso, fruto do poder familiar, consoante preleciona o artigo 1.630 do Código Civil
.
O alimentante afirma, em consonância com a versão da demandante, que era militar do Exército Brasileiro, esclarecendo que deixou as forças armadas e passou a trabalhar como taxista autônomo (fls. 42-43). Alega que possui dois filhos de outros relacionamentos (fls. 40-41), alcançando R$ 150,00 para cada um deles (fls. 44-45).
Analisando o conjunto probatório, verifica-se que inexiste nos autos qualquer comprovação da real situação financeira do alimentante. Porém, é possível verificar que houve, de fato, uma alteração nas suas possibilidades, benéficas ou não, desde que foi estabelecida a verba alimentar, conforme o próprio apelado confirma, referindo que não serve mais ao Exército Brasileiro e que trabalha de forma autônoma.
Diante desse novo cenário, cabe ao alimentante trazer aos autos comprovantes de sua renda atual. Ora, não há como impor a apelante a prova dos ganhos do genitor da infante, com fulcro no artigo 2º da Lei nº 5.478/68, que preleciona que o credor exporá apenas as suas necessidades. Portanto, cabe ao alimentante fazer a prova relativa aos seus rendimentos, visto que tem acesso a todos os dados necessários.
Nesse sentido, inclusive, é a lição de Maria Berenice Dias
, in verbis:
Vem se consolidando o entendimento de que, nas demandas alimentarias, se inverte a divisão tarifara dos encargos probatórios ( CPC 333). É o que se chama de distribuição dinâmica dos ônus da prova, defendida por Fredie Didier com base nos princípios da igualdade, da lealdade, da boa-fé, da solidariedade, do devido processo legal, do acesso à justiça e da adaptabilidade do procedimento.
Ao autor cabe tão só comprovar a obrigação do réu de lhe prestar alimentos. É o que diz a lei (LA 2.º): o credor exporá suas necessidades, provando, apenas, o parentesco ou a obrigação de alimentar do devedor. Não há como impor ao alimentando a prova dos ganhos do réu, pessoa com quem não vive, muitas vezes, nem convive, o que torna quase impossível o acesso às informações sobre seus rendimentos, eis não dispor o credor de acesso a tais dados, porquanto gozam de sigilo e integram o direito constitucional à privacidade e à inviolabilidade da vida privada ( CF 5.º X).
Nesse panorama, tendo em vista que o pai da infante trabalha sem vínculo formal, não tendo rendimentos fixos, deve o encargo alimentar ter por base o salário mínimo, de modo que seja estabelecido um parâmetro para os alimentos pagos mensalmente ao menor.
A propósito:
APELAÇÃO CÍVEL. REVISÃO DE ALIMENTOS. REDUÇÃO DO ENCARGO. FILHA MENOR DE IDADE. BINÔMIO NECESSIDADE/POSSIBILIDADE. ALTERAÇÃO EVIDENCIADA. SITUAÇÃO DE DESEMPREGO DO GENITOR. NOVA PROLE. PRINCÍPIO DA IGUALDADE ENTRE OS FILHOS E DA PROPORCIONALIDADE. AUSÊNCIA DE VÍNCULO FORMAL DE TRABALHO DO ALIMENTANTE. FIXAÇÃO DO PENSIONAMENTO SOBRE O SALÁRIO MÍNIMO NACIONAL. REDUÇÃO DO ENCARGO EM MAIOR EXTENSÃO. SENTENÇA REFORMADA. 1. A revisão de alimentos somente se justifica quando comprovada alteração do binômio necessidade/possibilidade. A obrigação deve ser fixada na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada, o que significa dizer, por outras palavras, que osalimentos devem ser fixados observando-se o binômio necessidade-possibilidade, visando à satisfação das necessidades básicas dos filhos sem onerar, excessivamente, os genitores. Hipótese em que o alimentante comprova redução da sua capacidade em decorrência da situação de desemprego. A minoração do encargo operada na sentença deve se dar em maior extensão, a fim de bem observar o binômio possibilidade-necessidade. 2. Em atenção aos princípios da igualdade entre os filhos e da proporcionalidade, pertinente a redução do valor dos alimentos. 3. Havendo vínculo formal de trabalho, os alimentos incidem sobre o salário, e, em se tratando de trabalhador autônomo, o encargo é fixado tendo por base o salário mínimo. APELO PARCIALMENTE PROVIDO. (Apelação Cível Nº 70069108298, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sandra Brisolara Medeiros, Julgado em 28/09/2016) (grifou-se).
Destarte, à luz do referido binômio necessidade-possibilidade, bem ainda atentando-se à razoabilidade, deve ser fixado alimentos no patamar de 30% do salário mínimo, motivo pelo qual merece prosperar o pleito.
Ante o exposto, o Ministério Público, nesta instância recursal, manifesta-se pelo CONHECIMENTO e pelo PROVIMENTO do recurso de apelação, nos termos da fundamentação.
ISTO POSTO, dou provimento ao recurso.
Des.ª Liselena Schifino Robles Ribeiro - De acordo com o (a) Relator (a).
Des.ª Sandra Brisolara Medeiros - De acordo com o (a) Relator (a).
DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES - Presidente - Apelação Cível nº 70071573950, Comarca de Bento Gonçalves:
\DERAM PROVIMENTO. UNÂNIME.\
Julgador (a) de 1º Grau: CHRISTIANE TAGLIANI MARQUES
? Art. 1.630. Os filhos estão sujeitos ao poder familiar, enquanto menores.
? DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 9ª Ed. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais. P. 587.
? DIDIER, Fredie. Curso de direito processual civil, v.2. Apud. DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 9ª Ed. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais. P. 587.
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