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- 2º Grau
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Inteiro Teor
@ (PROCESSO ELETRÔNICO)
IM
Nº 70065802191 (Nº CNJ: 0265597-97.2015.8.21.7000)
2015/Cível
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO ELETRÔNICO. PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DOS DOCUMENTOS. INTELIGÊNCIA DO ART. 6º, IV, DO ATO Nº 17/2012, ALTERADO PELO ATO Nº 20/2015, COMBINADO COM O ART. 525 DO CPC.
1. PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DOS DOCUMENTOS
No processo eletrônico, deve o agravante cumprir na integralidade o princípio da individualização dos documentos. Quer isso dizer que, para cada documento obrigatório ( CPC, art. 525, I), deve ser anexado um arquivo informando o teor. E diga-se o mesmo em relação aos facultativos ( CPC, art. 525, II). Deve o agravante anexar arquivo individual, de igual modo informando o teor, para cada documento ou conjunto de documentos que fundamentam cada afirmação feita no recurso baseada em prova.
2. ALTA CONVENIÊNCIA DA NUMERAÇÃO DOS ARQUIVOS
Considerando que o processo eletrônico, diferentemente do físico, não tem a numeração das folhas, é de alta conveniência que os arquivos sejam numerados para que o julgador possa indicar onde, no ambiente eletrônico, encontram-se os textos, provas e circunstâncias em que se baseou para formar sua convicção, cumprindo de modo suficiente o art. 131 do CPC.
3. CASO SUB JUDICE
O agravante apenas anexou arquivo individual em relação à peça recursal. Os demais arquivos, sob o título de “Outros”, não trouxeram a devida identificação em relação ao documentos obrigatórios e facultativos, o que não cumpre o princípio da individualização, imprescindível no processo eletrônico.
4. DISPOSITIVO
Negativa de seguimento por manifesta inadmissibilidade (CPC, art. 557, caput ).
Agravo de Instrumento | Primeira Câmara Cível |
Nº 70065802191 (Nº CNJ: 0265597-97.2015.8.21.7000) | Comarca de Dois Irmãos |
VANIA HANSEN KUNZLER | AGRAVANTE |
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL | AGRAVADO |
MUNICíPIO DE SANTA MARIA DO HERVAL | AGRAVADO |
DECISÃO MONOCRÁTICA
Vistos.
1. RELATÓRIO. Trata-se de agravo de instrumento interposto por VANIA HANSEN KUNZLER em face da decisão do juízo de Dois Irmãos que, nos autos da ação ordinária movida contra o ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL e o MUNICÍPIO DE SANTA MARIA DO HERVAL, “condicionou o recebimento da inicial à comprovação de pedido administrativo prévio de ressarcimento dos valores dispendidos com a realização do exame” (fl. 4).
2. FUNDAMENTAÇÃO. Faço a análise evidenciando três pontos: (a) princípio da individualização dos documentos; (b) alta conveniência da numeração dos arquivos; e (c) caso sub judice.
2.1. PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DOS DOCUMENTOS. O dito processo eletrônico foi instituído pela Lei 11.419/06, e regulamentado, no âmbito do Poder Judiciário Estadual, pelo Ato 017/2012-P, cujo art. 6º diz:
Art. 6º – Incumbe ao usuário do sistema o correto cadastramento dos dados solicitados no formulário eletrônico, sendo de sua responsabilidade as consequências decorrentes do mau preenchimento do formulário eletrônico e perda de prazo para conhecimento de medidas urgentes, bem como:
I – o sigilo da senha da assinatura digital, não sendo oponível, em qualquer hipótese, alegação de seu uso indevido;
II – o correto encaminhamento da petição;
III – a equivalência entre os dados informados e os constantes da petição remetida, considerando a correta classificação dos tipos de documentos e sua respectiva identificação no sistema;
IV – o lançamento de forma individualizada dos documentos no sistema;
V – as condições das linhas de comunicação e acesso ao seu provedor da rede mundial de computadores;
VI – a edição da petição e anexos em conformidade com as orientações contidas no “portal do processo eletrônico” (perguntas frequentes, demais manuais e documentos informativos, cujos links encontram-se na tela inicial do portal);
VII - o acompanhamento do processo.
Parágrafo único. A incorreta classificação de documentos ou a inadequada indicação das peças obrigatórias pode acarretar o atraso na tramitação do processo, sendo facultado ao magistrado determinar ao advogado a correção no cadastramento, na classificação ou, inclusive, o não conhecimento do pedido.
Mais recentemente, a redação do parágrafo único foi alterada pelo ATO Nº 20/2015, passando a ser a seguinte: “A incorreta classificação de documentos ou a inadequada indicação das peças obrigatórias pode acarretar o atraso na tramitação do processo, sendo facultado ao magistrado determinar ao advogado a correção no cadastramento e na classificação.”
Primeiro, confirma o princípio da individualização previsto no inciso IV; e, segundo, outorga ao julgador apenas faculdade de conceder oportunidade de correção, o que não acontecer, sob pena de se implantar no dito e temerário eletrônico todos os vícios existentes no processo físico.
Quem se aventurar à modalidade, primeiro deve se conscientizar de que o ambiente do processo eletrônico é diverso do ambiente do processo físico; e, segundo, que eletrônico é o processo, não o julgador nem a outra parte.
De nada adianta o processo eletrônico tramitar num “clic”, se não existe juiz eletrônico. O julgador continua sendo pessoa natural, e a análise e julgamento ocorrem pelos modos tradicionais. Não existe “modo clic” de julgar, que seria, exemplificando, o julgamento por íntima convicção. O juiz continua obrigado a julgar conforme a prova dos autos e a fundamentar ( CPC, art. 131; CF, art. 93, IX).
Isso basta para concluir que a implantação do dito eletrônico vendendo a ideia da justiça rápida não passa de propaganda enganosa. Associar o processo eletrônico à idéia de justiça rápida é falácia pura.
Todos sabem que na realidade o que torna a justiça morosa não é a locomoção física do processo ou o tempo necessário para serem cumpridas as determinações judiciais, mas o tempo que ele fica aguardando pauta de audiência e a prática dos atos judiciais ( CPC, art. 162), especialmente julgamentos típicos (decisões interlocutórias, sentenças e acórdãos).
Todos sabem também que isso acontece em razão do volume excessivo, o que informa grande explosão de litigiosidade social, bem assim em razão das excessivas possibilidades recursais, o que informa discussões, rediscussões, discussões de rediscussões, levando o término quase às calendas gregas.
Importante, no se refere ao volume excessivo, a divulgação do Conselho Nacional de Justiça, em 2014, relativo a 2013, sob o título Justiça em Números. O país, então com aproximadamente 200 milhões de habitantes, estava com 95 milhões de processos, dos quais 74 milhões (= 78%) tramitando na Justiça Estadual. Se considerarmos que em cada um existem pelo menos duas pessoas envolvidas, e ressalvado os milhões ajuizados contra a mesma pessoa (Poder Público), pode-se dizer que bem mais da metade da população brasileira está envolvida com o Judiciário.
Isso por um lado. Por outro, 16 mil era o número de magistrados no Brasil, portanto, em média 6 mil processos para cada um. Imagine-se as várias intervenções judiciais em cada processo e as quase infinitas possibilidades recursais. Eis, pois, uma das grandes causas – senão a principal – da justiça morosa.
Por isso, considerando que o processo eletrônico não multiplica o número de julgadores nem instaura nova forma de julgar, não resolve absolutamente nada em termos de celeridade. Ao contrário, ao julgador é muito, muito mais difícil, não raras vezes impossível, examinar as provas no respectivo ambiente. O tempo necessário ao exame pelo julgador é muito maior.
Portanto, se ele foi implantado para acelerar a justiça, o tiro está saindo pela culatra, pois na prática a está travando ainda mais em relação aos julgamentos típicos; e, se implantado também para resolver a questão econômica do papel, outra vez o tiro está saindo pela culatra, pois se generaliza a impressão das principais peças, formando-se autos suplementares, o que acontece às custas do erário, a fim de tornar possível o exame e a prestação jurisdicional.
Para que o processo eletrônico seja viável em termos mínimos, quem se aventurar a utilizá-lo deve começar pelo cumprimento rigoroso das formalidades na sua composição, sob pena de inviabilizá-lo à outra parte e muito especialmente à atividade jurisdicional. E nem falo da baixa qualidade da imagem de muitos documentos, tornando impossível a leitura, e que são por isso considerados inexistentes por inacessibilidade do conteúdo, como já acontece com as fotocópias borrões no processo físico.
Pois bem.
Em relação à composição, especificamente no que tange ao agravo de instrumento, como é sabido, os documentos obrigatórios, previstos no inciso I do art. 525 do CPC, conferem ao recurso perfeição formal, quer dizer, o descumprimento gera inadmissibilidade, enquanto os facultativos, previstos no inciso II, objetivam provar o direito alegado, quer dizer, a omissão conduz em princípio à improcedência do recurso por não ter o recorrente se desincumbido do ônus da prova.
Na realidade, o Código já prevê a individualização dos documentos no processo físico, em especial os obrigatórios, o que os recorrentes em geral não cumprem, e o julgador às vezes tolera, levando em conta a singeleza do caso e a facilidade de encontrar as provas. Na essência, é o mesmo princípio da especificação das provas e de suas indicações nos arrazoados ( CPC, art. 300), e que no contraponto obrigam ao julgador cumprir o art. 131.
Já no eletrônico o cumprimento do princípio da individualização dos documentos é imprescindível, a fim de que o julgador saiba onde ver preenchidos os requisitos de admissibilidade e onde localizar a ratificação, ou não, das assertivas a respeito do bem da vida pretendido pelo recorrente, e, assim, formar a sua convicção.
Por isso, a maneira de o recorrente cumpri-lo em relação aos documentos obrigatórios, é anexar arquivo individual para cada um, informando qual prova se acha dentro dele (decisão recorrida, certidão de intimação, etc.). E diga-se o mesmo em relação aos facultativos. Deve o agravante anexar arquivo individual, de igual modo informando o teor, para cada documento que fundamenta cada afirmação feita no recurso baseada em prova.
2.2. ALTA CONVENIÊNCIA DA NUMERAÇÃO DOS ARQUIVOS. Refiro ainda a alta conveniência da numeração dos arquivos, pois o processo eletrônico, diferentemente do físico, não contém a numeração das folhas para que o julgador possa fazer a chamada “amarração”, isto é, indicar onde, no ambiente eletrônico, encontram-se os textos, provas e circunstâncias em que se baseou para formar sua convicção, enfim, para que possa cumprir de modo suficiente o art. 131 do CPC.
Noutras palavras: o que no processo físico se faz indicando o número da folha, no eletrônico é feito indicando o número do arquivo. Tem-se procurado superar essa falha indicando, quando existente, o número da folha do processo de origem, o que torna a análise ainda mais demorada.
Uma vez ciente de como deve ser cumprido rigorosa e integralmente o princípio da individualização dos documentos, pode alguém se aventurar no temerário processo eletrônico.
2.3. CASO SUB JUDICE. O agravante apenas anexou arquivo individual em relação à peça recursal. Os demais arquivos, sob o título de “Outros”, não trouxeram a devida identificação em relação ao documentos obrigatórios e facultativos, o que não cumpre o princípio da individualização, imprescindível no processo eletrônico.
3. DISPOSITIVO. Nesses termos, nego seguimento ao recurso por manifesta inadmissibilidade (CPC, art. 557, caput).
Intime-se.
Porto Alegre, 27 de julho de 2015.
Des. Irineu Mariani,
Relator.